Ardósia na Arquitetura Sustentável: Certificações e Práticas Responsáveis (Parte 1)
- Pedro Lucas
- 12 de jun.
- 5 min de leitura

Em um mundo cada vez mais consciente dos impactos ambientais da construção civil, a escolha de materiais sustentáveis tornou-se um diferencial competitivo e uma responsabilidade ética para profissionais e empresas do setor. A ardósia, pedra natural com longa tradição de uso na arquitetura, encontra-se em um momento de redefinição de sua imagem e posicionamento no mercado, buscando alinhar-se às demandas contemporâneas por sustentabilidade e responsabilidade socioambiental.
Este artigo explora como a indústria da ardósia está se transformando através de certificações ambientais, práticas responsáveis de extração e beneficiamento, e aplicações inovadoras que maximizam seu ciclo de vida, consolidando este material milenar como uma escolha alinhada aos princípios da arquitetura sustentável do século XXI.
Certificações Ambientais para Extração e Beneficiamento
A credibilidade ambiental de um material natural como a ardósia depende cada vez mais de certificações reconhecidas que atestem práticas responsáveis em toda sua cadeia produtiva. Estas certificações não apenas validam o compromisso ambiental dos produtores, mas também se tornaram requisitos essenciais para projetos que buscam selos de construção sustentável.
ISO 14001: O Padrão Global para Gestão Ambiental
A certificação ISO 14001 estabelece critérios para um sistema de gestão ambiental eficaz e tem se tornado um diferencial importante para empresas do setor de ardósia. Para obter esta certificação, os produtores precisam:
•Implementar um sistema abrangente de gestão ambiental
•Identificar e controlar o impacto ambiental de suas atividades
•Melhorar continuamente seu desempenho ambiental
•Implementar uma abordagem sistemática para definir objetivos ambientais
No Brasil, empresas como a Micapel e a Ardósia Capivara foram pioneiras na obtenção da ISO 14001, implementando sistemas de gestão que incluem:
•Tratamento e recirculação de 95% da água utilizada no beneficiamento
•Redução significativa na geração de resíduos sólidos
•Monitoramento contínuo de emissões atmosféricas
•Programas de recuperação de áreas degradadas pela mineração
A certificação ISO 14001 não apenas valida práticas ambientais responsáveis, mas também facilita a exportação para mercados exigentes como o europeu, onde critérios ambientais são frequentemente barreiras não-tarifárias para produtos importados.
Certificação NSC 373 para Pedras Naturais Sustentáveis
Desenvolvida especificamente para o setor de pedras naturais, a certificação NSC 373 (Natural Stone Council) é considerada o padrão ouro para sustentabilidade na indústria. Esta certificação avalia:
•Gestão da água e redução do consumo
•Transporte e cadeia de custódia
•Gestão de produtos químicos e materiais
•Gestão de resíduos sólidos
•Gestão da terra e recuperação de ecossistemas
•Responsabilidade corporativa e governança
•Inovação em práticas sustentáveis
Embora ainda pouco difundida no Brasil, produtores de ardósia que buscam acesso ao mercado norte-americano estão começando a implementar os requisitos da NSC 373, que é reconhecida pelo sistema LEED (Leadership in Energy and Environmental Design) e pode contribuir para a obtenção de créditos em projetos que buscam esta certificação.
Declaração Ambiental de Produto (EPD)
As EPDs (Environmental Product Declarations) são documentos verificados independentemente que fornecem informações transparentes e comparáveis sobre o impacto ambiental de um produto ao longo de seu ciclo de vida. Para a ardósia, as EPDs tipicamente incluem:
•Análise do ciclo de vida (ACV) completa
•Pegada de carbono da extração ao descarte
•Potencial de aquecimento global
•Consumo de recursos não renováveis
•Potencial de acidificação e eutrofização
•Consumo de água e energia
Empresas brasileiras como a Ardósia Brasil e a São Tomé Pedras já desenvolveram EPDs para seus produtos de ardósia, facilitando sua especificação em projetos internacionais que exigem esta documentação. As EPDs são particularmente valorizadas em sistemas de certificação de edificações como BREEAM (Building Research Establishment Environmental Assessment Method) e o sistema alemão DGNB.
Certificação de Origem e Rastreabilidade
Uma tendência crescente no mercado de materiais sustentáveis é a certificação de origem e rastreabilidade, que permite ao consumidor final conhecer todo o percurso da pedra, desde a jazida até a aplicação final. Sistemas como o "Stone Passport" documentam:
•Localização exata da jazida de origem
•Métodos de extração utilizados
•Condições de trabalho na extração e beneficiamento
•Distâncias percorridas em cada etapa logística
•Processamentos e tratamentos aplicados
Esta transparência na cadeia produtiva é particularmente valorizada em projetos de alto padrão que buscam não apenas sustentabilidade ambiental, mas também responsabilidade social em suas especificações de materiais.

Práticas Sustentáveis na Cadeia Produtiva
Além das certificações formais, a indústria da ardósia tem implementado práticas inovadoras que reduzem significativamente seu impacto ambiental em cada etapa da cadeia produtiva.
Extração de Baixo Impacto
A extração tradicional de ardósia frequentemente envolvia métodos invasivos com alto impacto ambiental. As novas práticas de extração de baixo impacto incluem:
•Planejamento geológico avançado: Utilização de tecnologias como radar de penetração no solo (GPR) e modelagem 3D para planejar a extração de forma a minimizar desperdícios e otimizar o aproveitamento da jazida.
•Extração seletiva: Em vez de remover grandes volumes de material indiscriminadamente, a extração seletiva remove apenas os blocos com qualidade comercial, reduzindo o volume de rejeitos.
•Tecnologia de corte a fio diamantado: Substitui explosivos e métodos mecânicos agressivos, reduzindo ruído, vibração e geração de poeira, além de permitir cortes mais precisos que maximizam o aproveitamento.
•Gestão hidrológica integrada: Sistemas que monitoram e preservam os recursos hídricos locais, evitando contaminação e garantindo que a extração não afete o lençol freático ou cursos d'água próximos.
A empresa mineira Pedras do Brasil implementou um sistema pioneiro de extração de ardósia que reduziu em 40% o volume de rejeitos gerados e diminuiu o consumo de água em 60% comparado aos métodos tradicionais.
Beneficiamento Ecoeficiente
O processamento da ardósia após a extração também passou por uma revolução em termos de sustentabilidade:
•Sistemas fechados de recirculação de água: Reduzem o consumo de água em até 95% comparado a sistemas convencionais, além de eliminar o descarte de efluentes contaminados.
•Aproveitamento de resíduos de corte: Fragmentos e pó de ardósia, antes considerados rejeitos, são agora processados para uso como agregados em concreto, componentes de argamassas especiais e até mesmo como corretivo de solo na agricultura.
•Eficiência energética: Implementação de motores de alta eficiência, sistemas de recuperação de calor e otimização de processos que reduzem o consumo energético do beneficiamento.
•Redução de produtos químicos: Desenvolvimento de processos de acabamento que minimizam ou eliminam o uso de resinas e produtos químicos potencialmente nocivos.
A fábrica da Ardósia Capivara em Papagaios (MG) implementou um sistema integrado de beneficiamento ecoeficiente que reduziu seu consumo energético em 35% e eliminou completamente o descarte de efluentes, tornando-se um modelo para o setor.
Logística Verde
O transporte representa uma parcela significativa da pegada de carbono de materiais pesados como a ardósia. Iniciativas de logística verde estão transformando esta realidade:
•Otimização de rotas e cargas: Sistemas computadorizados calculam as rotas mais eficientes e maximizam o aproveitamento da capacidade de carga dos veículos.
•Modernização da frota: Substituição gradual por veículos mais eficientes e menos poluentes, incluindo alguns movidos a biocombustíveis.
•Compensação de carbono: Programas que calculam e compensam as emissões inevitáveis através de projetos de reflorestamento ou energia renovável.
•Embalagens sustentáveis: Substituição de materiais de embalagem convencionais por alternativas recicláveis ou biodegradáveis, reduzindo significativamente o impacto ambiental do transporte.
A Associação Brasileira da Indústria de Rochas Ornamentais (ABIROCHAS) desenvolveu um programa setorial de logística verde que já reduziu em 25% as emissões de CO₂ associadas ao transporte de pedras naturais, incluindo a ardósia.




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